
Amigos, aqui vai uma historinha prosaica, mas cheia de significado.
Como preâmbulo, preciso dizer que estou fazendo um monólogo sobre os últimos anos do grande João Guimarães Rosa, um dos maiores escritores brasileiros, de fama mundial, candidato ao Nobel de Literatura, mas que jamais perdeu contato com sua origem do interior de Minas Gerais, a sereníssima Cordisburgo – razão de seu orgulho e paixão.
Para acrescentar, conseguimos montar nosso espetáculo graças aos amigos que doaram sua força de trabalho, emprestando suor e talento que contribuíram demais para o sucesso desse monólogo modesto, mas cheio de sinceridade e amor ao Teatro e à Literatura. E à vida de todos nós, que, sendo geniais como o Rosa, ou meros mortais como a gente, temos sempre uma vida importantíssima e cheia de emoções – basta saber enxergar.
Dito isso, preciso contar que quando estávamos preparando um materialzinho de divulgação, e sabendo da paixão do Rosa por gatos, resolvi tirar umas fotos com o Floquinho, um lindo gato branco que se hospedava aqui em casa. Gato gigantesco, cheio de temperamento, que dominou o território da minha casa, deixando até meus enormes cães constrangidos. O fato é que ele ficou no meu colo e fizemos uma peça de divulgação em que ele sempre será o personagem principal. Um gato que sempre chamou a atenção por sua beleza e olhar autoritário.
Essas modestas peças de publicidade circulam pelas redes, com o Floquinho centralizando as atenções.
O Floquinho passou uns meses aqui em casa, mas não conseguimos mantê-lo exatamente porque ele atuava como comandante-geral da coisa toda, assustando os nossos outros gatos e nossos dois cães gigantescos, mas que ficaram acabrunhados pela forte presença do Floquinho. Muitas vezes, ele se estabelecia no meio da sala, altivo e calado, impedindo a circulação de todos. Floquinho sempre foi fogo na roupa. Sua calada autoridade intimidava os bichos todos. E, mesmo sem querer, desestabilizou a família inteira.
Embora fosse majestoso e amado pela Silvana e por todos nós, foi impossível mantê-lo. Floquinho não conseguiu se adaptar aos outros gatos, aos cães e foi necessário, como já havia sido previamente combinado, que ele voltasse para a antiga dona. Agora já fazia alguns meses que o Floquinho estava de volta ao seu antigo lar, mas a gente sempre ligava pra saber dele. Numa última ligação, semana passada, fomos informados de que ele estava doente. Silvana, minha parceira e amante incondicional de animais, foi correndo em auxílio do Floquinho. Levamos o gigante pro veterinário e a situação dele não era boa, tanto que permaneceu internado. Mas não resistiu. O estado dele era grave e, no dia seguinte, Floquinho se foi – apesar das tentativas de fazê-lo se recuperar.
Agora Floquinho está imortalizado numa foto no meu colo, fazendo parte da nossa vida, da vida do Rosa e da história do teatro.
Seremos sempre agradecidos a ele, assim como somos a todos que trabalharam quase de graça – ou de graça mesmo – para que PORMENOR DE AUSÊNCIA tomasse corpo e ganhasse os palcos.
Como disse o grande Rosa em seu discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, em 1967: “ O MUNDO É MÁGICO”.