
Quando o assunto é entretenimento, ficção, diversão, seja na TV ou no Teatro ela aparece com um longo e premiado currículo. Minha entrevistada dessa semana é a roteirista, criadora e dramaturga Renata Mizrahi.
Renata Mizrahi (criadora e roteirista) é formada em Artes Cênicas na UNIRIO. Estudou roteiro na EICTV em Cuba, e na Oficina de Autores da TV Globo. Professora de roteiro de Roteiraria.
Ganhou o Prêmio Cabíria 2020 (com Renata Diniz) para argumento de longa Infanto – juvenil por Rodante. Ganhou o Prêmio de Melhor Roteiro de Longa Metragem (com Tuca Siqueira) no Festival de Triunfo (2018) por Amores de Chumbo (atualmente na plataforma Amazon). Ganhou Prêmio Comkids (2016) do programa infanto-juvenil Tem Criança na Cozinha, no qual desenvolveu e roteirizou e foi exibido no Canal Gloob (atualmente na plataforma Globo Play) O programa também foi indicado ao Emmy Kids (2018)
No teatro, ganhou o Prêmio Shell por Galápagos, em 2014. Ganhou os prêmios Zilka Salaberry 2010 e 2012 pelos infantis Joaquim e as Estrelas e Coisas que a Gente Não Vê. Foi indicada a melhor texto por Os Sapos no Prêmio Cesgranrio 2013. Foi indicada a melhor texto por Silêncio! no Prêmio Cesgranrio 2014. Foi indicada a melhor texto nos Prêmio Zilka Salaberry e CBTIJ (2016) por: Marrom, Nem Preto Nem branco? Foi indicada a melhor texto adaptado nos Prêmios Zilka Salaberry (2013) por Nadistas e Tudistas. Foi indicada a Melhor texto adaptado nos Prêmios Zilka Salaberry e CBTIJ (2016) por Ludi Na Revolta da Vacina.
É autora de mais de 27 (vinte e sete) peças, entre elas: Chica da Silva – O Musical, que rendeu prêmio Shell de melhor atriz para Vilma Melo.
Escreveu a segunda temporada de Homens São de Marte (GNT). Escreveu a segunda temporada da série Matches para o canal Warner. Escreveu Minha Estupidez (GNT), Vai que Cola, A Vila (Multishow), entre outros. É autora e roteirista do telefilme inédito Maria, com direção de Iberê Carvalho (TV Globo/ Globo Filmes). É autora e roteirista do longa Os Sapos, que está em pré-produção, baseado na sua peça homônima, sob direção de Clara Linhart. Entre outros. Ufa! Terminamos, por ora.
JP – Você é carioca. Como foi a sua infância na “cidade maravilhosa”? Onde você estudou?
Eu sou carioca. Nasci no bairro de Ipanema. Aos cinco anos, eu fui morar em São Conrado com os meus pais. Eu sou de uma família judaica, que era uma família bastante estabilizada. Até que, aos meus doze anos de idade, os meus pais foram a falência e se separaram. Aí foi um caos. Eu fiquei morando com meu pai e meus irmãos. Sozinhos. E ele se dividia entre a música e a loja, na qual se deu a falência. Então muito cedo, eu comecei a trabalhar. Nós perdemos a bolsa na escola. E eu fui correr atrás das coisas. Não tinha mais nada de mão beijada. E iniciei a trabalhar muito cedo. E eu entrei para o teatro entre os meus 17 e 18 anos. Eu vi uma possibilidade de entendimento, um caminho que me salvou, me curou. E, ao mesmo tempo, eu entendi que queria fazer disso a minha profissão. E, principalmente, eu comecei a ver que eu queria escrever, e hoje eu escrevo para teatro e audio-visual.
JP – Qual é a sua formação? Quando você começou a se interessar pela escrita de textos?
Eu sempre gostei de escrever. Desde criança, eu escrevia muita poesia. Num primeiro momento, eu realizei o curso de História na UERJ. Eu amei. Mas não era muito aquilo que eu queria. Eu era muito nova. Quando eu comecei a fazer teatro, eu comecei como atriz, eu comecei a fazer tablado, e tinha o festival de cenas curtas, e eu escrevi a minha própria para atuar. Foi aí que eu vi uma porta se abrindo. Então, eu deixei história, fui fazer Artes Cênicas na UNIRIO. Ainda na UNIRIO, eu entrei para uma Companhia de Teatro de Nós, onde eu escrevia para eu atuar, ao lado dos outros integrantes. Começamos fazer repertório de peças, onde no início eu atuava. Mas com o passar do tempo, eu fui vendo que o meu barato era escrever do que atuar. E eu fui me formando mas muito na intuição. Não tinha muito curso na época. E, com isso eu fui pegando ferramenta, e aos poucos eu fui me aprimorando, eu fui fazendo os cursos de escrita. Fiz uma Oficina de Autores na Globo em 2010. Fui para Cuba estudar roteiro em 2013. E, fui me desenvolvendo muito na prática também.
JP – Como você define um texto de Teatro? Quais são as suas características?
O texto de Teatro é um texto que tem uma história. Eu gosto de início, meio e fim. Eu gosto de contar uma história pé no chão. Mas tem que ter a dinâmica. Não só blocos grandes de diálogos, mas também diálogos potentes, criativos. Acho que o principal é uma boa história. E o que leva a uma boa história são bons personagens. O público se identifica com os bons personagens. Então, o núcleo do texto que iremos apresentar para falar do macro, de dedicação, do afeto, de universalidade, seja uma história dramática, épica, ou que se passe numa guerra mundial, ou uma história que se passe em casa, de mãe e filho, ou num apartamento. Esses personagens e as situações são os principais elementos, e os diálogos potenciais são os que eu gosto muito de trabalhar.
JP – Escrever um texto para o Teatro é a mesma coisa que redigir um texto para a televisão? Justifique.
De jeito nenhum. São coisas completamente diferentes. No teatro, você tem mais liberdade. Você tem um quadro, está trabalhando com a palavra. Na TV, você está trabalhando com imagem. E a imagem diz muito mais do que a palavra. Então, tem uma coisa que é bem parecida. Você precisa de público, de espectador. Sem espectador, não tem história, não tem peça, não tem audiovisual. Mas as narrativas das formas são diferentes. No teatro, eu brinco mais com as palavras, com a brincadeira, com a musicalidade. Com a TV, tem a imagem, e ela tem uma força muito grande. E ela diz muito mais do que as palavras.
JP – No ano de 2014 você estreou uma peça de teatro no CCBB RIO intitulada Galápagos. O espetáculo foi sucesso de crítica e público, e você foi premiada com o texto mencionado. Como foi o processo de criação de Galápagos? Qual é a importância do texto para a sua trajetória?
Galápagos foi um divisor de águas não apenas na minha carreira, mas também na minha escrita. Foi um lugar onde eu consegui aprofundar. E, depois de Galápagos, eu sempre me pergunto se eu posso mais. Galápagos foi um processo longo porque primeiro criamos uma sinopse, junto com o Kadu Garcia e o Paulo Giannini, que são os dois atores da peça. Eles adoraram a sinopse. Mas para eu fazer um diálogo potente, um encontro, um embate, e segurar uma história de uma hora. Então, foi um processo que eu fiz um levantamento, as questões iniciais, e quando começou a ensaiar, eu fui a assistente da diretora, Isabel Cavalcanti, e nós fizemos um processo de entendimento do que precisava melhorar, de aprofundar. E eu entendi que enquanto eu não achasse o ponto fraco dos dois personagens, no equilíbrio, a peça não ia ficar boa. E esse encontro, essa chave não foi fácil. Eu acho que foi entre quinze ou vinte tratamentos, que nós tirávamos, cortávamos, botava, inseria, excluía novamente, e eu encontrei o ponto fraco de um dos personagens que era mais distante de mim, que é o personagem cego, artista plástico, milionário. E conseguimos encontrar a peça. Isso foi durante o processo de ensaio, que durou uns três meses. E isso foi muito bom. Eu tive que me desafiar, ir além de mim. Junto, instigada e motivada com a equipe principal, que é Kadu, Paulinho, e Isabel.
JP – Você também produz textos para o universo infantil. Gabriel Só Quer Ser Ele Mesmo é um sucesso de público e de crítica. Qual é a importância do teatro infantil para vc? Como é a escrita desse texto?
Escrever para o teatro infantil é uma coisa muito importante, que eu amo, me divirto. Escrever para criança é um ato político. Porque quando falamos com uma criança, também estamos falando com os pais. Então escrever para o teatro infantil é alcançar as mãos da criança no invisível. É uma coisa que eu adoro. Eu tenho filho. Eu sou uma pessoa que lido muito com criança. Dei muita aula de teatro para criança. Gosto de entender como elas pensam o mundo e propor e provocar reflexões sobre essa idade, muito para que possamos ir numa direção de livre expressão, liberdade, e como uma criança tem uma lógica diferente de conexão. É um tipo de texto que eu adoro escrever, tanto no teatro, quanto no audiovisual.

JP – Mãe de Santo é um texto sobre a mulher negra, a sua vivência, a sua experiência. Como foi o processo de criação desse texto? Qual é a sua proposta?
Mãe de Santo vem de uma parceria de longos anos e profundidade com a Vilma Melo. Ela recebeu o argumento da Helena Theodoro e me chamou para fazer esse argumento em texto. Em trazer as ideias. Em trazer a teatralidade. Tem a Vilma como parceira. E eu também sou muito o caminho que a Vilma pode fazer como atriz, artista, e enquanto discurso. Então o teatro veio também para aprofundar a minha aliança com a Vilma, e trazer dentro de um debate sobre a mulher negra, sobre o racismo, a própria mãe de santo, a partir da base muito importante da Helena. Eu e a Vilma somos uma parceria que dá certo!
JP – Quais são os seus projetos futuros?
No projeto do audiovisual, quando eu pego algumas peças minhas e transformo em longa, e em série também. Como projeto futuro, é conseguir me sustentar com o meu trabalho, conjugando algumas peças com o audiovisual. Os sapos já está para ser lançado. E seguir com o meu trabalho.
JP – Vale a pena ser autora de texto teatral no Brasil? Como você avalia a produção textual cênica brasileira contemporânea?
Vale a pena! Mas é um lugar de muita luta, de enfrentamento, de machismo, de uma sociedade patriarcal. Uma mulher tem que fazer muitas coisas para ser reconhecida. E eu me sinto nesse lugar. Mas, eu não consigo viver sem fazer outra coisa. Eu consegui tentando encontrar qualidade de reconhecimento, de qualidade de trabalho. Sempre aperfeiçoando, nunca estagnando. Nós temos que ser sim autora e dramaturga nesse país, ocupar esse espaço, uma dando a mão para a outra.