
Com uma trajetória que ultrapassa quatro décadas, Isaac Bernat é uma das personalidades de maior destaque do teatro brasileiro e carioca. Ator, diretor e professor, Bernat acumula prêmios como o Botequim Cultural e Zilka Salaberry, consolidando-se como referência nas artes cênicas.
Em 2026, ele completa 45 anos de uma carreira marcada por intensidade e versatilidade, com mais de 120 espetáculos em seu currículo, incluindo grandes sucessos como “Incêndios e Céus”, sob a direção de Aderbal Freire-Filho. Além disso, ele dirige peças que se tornam longevas, como “Calango Deu”, há 12 anos em cartaz. Doutor em Teatro pela UNIRIO, Bernat ainda atua como professor há três décadas na Casa das Artes de Laranjeiras (CAL), influenciando gerações de artistas.
Na entrevista a seguir, o diretor compartilha suas reflexões sobre o ofício, as transformações no cenário artístico e seus projetos para o futuro, reafirmando sua paixão pela arte e pela troca com o público.
JP – Uma questão que está inquietando o meio artístico é a perda dos papéis centrais nas produções artísticas pelos artistas mais experientes e veteranos. Como você pensa essa questão?
Bom, eu não sinto isto. Até porque cada papel tem a ver com as características do ator ou da atriz necessárias para que a atuação seja convincente. É natural e faz parte do universo artístico que Surjam novos talentos. Acredito que uma das vantagens do nosso oficio é que sempre vai ter um personagem que corresponda a sua idade, tempo de jornada e singularidade.
JP – Qual é o seu ponto de vista sobre a escalação de influenciadores digitais nas produções do audiovisual?
Se eles forem escalados unicamente por serem influenciadores digitais é muito triste, pois o nosso ofício requer estudo, dedicação, aprimoramento e comprometimento, além do talento para atuar. No entanto se o influenciador mostrar aptidão, seriedade e interesse
em evoluir e estudar, por que não?
JP – Como se deu o seu interesse pela arte de representar?
Eu fiz um curso de Teatro em 1980, com a grande atriz Gilda Guilhon, no Teatro Cândido Mendes inaugurado no mesmo ano, e me apaixonei profundamente pela cena. Criamos um grupo chamado “Desesperar Jamais”, com amigos como Claudio Torres Gonzaga, Suzana Abranches, Charles Kahn, Felipe Martins, Maristela Provedel, Bruno Fernandes, Eugenio Brodbeck, Fernando Weltman, Sueli Moreira, Conceição Rios, Bebel Nascimento entre outros, e montamos a peca “A Muralha da China” de Max Frisch, com direção de Ariel Coelho, no extinto Teatro da Galeria, que agora ironicamente virou uma academia de ginástica. Depois desta peça, não parei mais. Terminei a Faculdade de Jornalismo, mas já estava seduzido pra sempre pelo Teatro. Em 2026, completarei 45 (quarenta e cinco) anos de carreira.
JP – Como se deu a sua formação como ator e diretor? Quais são as suas referencias (teóricas e práticas) na área do teatro?
Fiz Mestrado e Doutorado em Teatro na UNIRIO e vários cursos ao longo destes anos todos. Além do curso da Gilda Guilhon, onde tudo começou, destaco o Encontro que tive durante 10 anos, como o griot Sotigui Kouyaté. Ele é um divisor de águas na minha vida, mais do que um Mestre é um pai pra mim. Fiz varias oficinas com ele, o acompanhei numa viagem a Mali e Burkina Fasso, na África, e escrevi uma tese de Doutorado a partir da nossa convivência.
Esta Tese deu origem ao livro ‘Encontros com o griot Sotigui Kouyaté” (Pallas Editora). Preciso destacar também o meu Encontro com o grande diretor Aderbal Freire Filho, que me dirigiu em duas peças do autor libanês Wajdi Mouawad, “Incêndios” e “Céus”. Aprendi muito com ele. Quando dirijo penso muito em como Aderbal faria e como Sotigui estimularia o jogo entre as atrizes e os atores e também a forma de se relacionar com o público. Os Meus
Mestres sussurram no meu ouvido, e eu escuto. Além disso, é claro que conta muita ter feito mais de 120 peças como ator e diretor, fora filmes, novelas e seriados. Além disso, em 2026 completo 30 anos como professor da CAL (Casa das Artes de Laranjeiras), lá sou professor de interpretação e montagem, e isto também me forma, pois ao ensinar se aprende muito. Tenho ministrado oficinas pelo país com patrocínio da Petrobrás junto com as turnês de “Cora
do Rio Vermelho” e tenho trocado muito com os participantes de várias regiões do país, e isto me enriquece muito como pessoa e como artista. Em suma, tenho uma formação teórica, ligada a Academia, onde participo frequentemente de bancas de Mestrado e Doutorado, o que me alimenta muito também. Sou um leitor voraz, não só de teatro. Os livros, o cinema, as exposições, a música, os jornais e revistas fazem parte da minha formação que
não para nunca.
JP – Quais são os requisitos necessários para ter uma carreira consolidada e reconhecida?
Curiosidade, perseverança, paciência, estudo, dedicação, escuta, interesse, experiências plurais e diversas, dignidade, empatia, ética, respeito ao público e amor ao ofício.
JP – Como foi pensada a direção da peça Mostra a tua Cara?
Acredito que o mais importante na peça foi estabelecer uma relação franca e direta com o público. Desde o início as atrizes e os atores já propõem isto ao entrarem pela plateia interagindo com o público, e, durante a peça, o tempo todo esta relação se mantém. As luzes da plateia não se apagam, assim o elenco consegue ver com nitidez a audiência e manter contato o tempo todo. Nos ensaios trabalhamos este lado épico e de certa forma performático com as atrizes e os atores. Mas é claro, que o mais importante além do excelente texto do Rogerio Corrêa e da equipe de criação luxuosa ( Aurélio de Simoni, Dóris Rollemberg, Charles Kahn, Margo Margot, Adriana Bonfatti, Paula Furtado, Rômulo Corrêa, Cristiana Lobo, Malu Costa e da equipe técnica) é o trabalho impecável do elenco que conquista a plateia. Alexandre Galindo, Ângela Rebello, Letícia Isnard e Thadeu Matos são a cereja do bolo. A peça é uma verdadeira confissão de quatro personagens emblemáticos sobre as suas experiências na chamada “era Collor”.
Eu diria mesmo que além de toda a pesquisa criteriosa sobre a história daquele período, tem também o delicioso papo de bar, onde muita coisa que não é dita no cotidiano vem à tona com características tragicômicas.
JP – Quais são os seus projetos futuros?
Varias pecas que dirigi continuarão rodando pelo Rio de janeiro e pelo Brasil. Cora do Rio Vermelho” dramaturgia de Leonardo Simões, com Raquel Penner, “Eu Amarelo – Carolina Maria de Jesus”, de Elissandro de Aquino com Maiara Carvalho, “Calango Deu” com Suzana Nascimento, “Deixa Clarear” de Marcia Zanelatto, com Clara Santana. Tem também as peças infantis, “As aventuras de pé de vento, no dia de Cosme e Damião, de Fatima Colin, “A história de Kafka e a boneca Viajante”, dramaturgia de Julia Bernat, “Rosa e A Semente” e “Rosa e a Floresta” ambas com
o grupo Pedras. Espero que “Mostra a tua Cara” de Rogerio Correia, continue também. Geralmente as pecas que dirijo ficam anos em cartaz. “Calango Deu” está há 12 anos em cartaz, “Deixa Clarear há 11 anos, “Eu Amarelo-Carolina Maria de Jesus” há 6 anos e “Cora do Rio Vermelho “ esta indo pro quarto ano. Acho que dou sorte né? Aguardo respostas de vários editais, de projetos novos e super interessantes, Inclusive um monólogo pra fazer como ator de um excelente dramaturgo português, Ricardo Cabaça. Vamos torcer!