
Estreou no teatro do CCBB RIO 3 a peça teatral Zona Lésbica.
O espetáculo é uma idealização de Carolina Godinho, Dani Nega, e Monique Vaillé.
A dramaturgia é de Verônica Bonfim, autora preta ativista, que constrói uma narrativa que busca dar voz às falas silenciadas das mulheres lésbicas. Veronica é uma mulher escrevendo sobre os corpos femininos. E ninguém mais perfeita do que ela para redigir o texto, porque ela compreende os medos, tensões e aflições que pairam sobre as mentes dessas mulheres, bem como os seus desejos e anseios. Mulheres que já foram perseguidas pela polícia, chicoteadas pela família, e foram tratadas com indiferença. E, Veronica busca mostrar que é preciso enxergá-las, e amá-las.
O texto, sem pudor e medo algum, traz ao público o início da inserção de cada uma das sete atrizes que integram o elenco em sua zona lésbica. No formato de dois pares e um trio, cada uma delas apresentou a sua entrada no universo homo feminino, sem pudor algum, de forma livre e espontânea, sincera, transparente, emocionante, pois elas são de carne e osso. E ao se declarar em público, elas deixam transparecer a necessidade urgente e imediata do fim do patriarcado, que impõe os valores de um mundo machista e hetero-normativo, racista, agressivo e violento.
As sete mulheres lésbicas desejam chegar à Zami, uma zona lésbica onde impera o amor, a amizade, a fraternidade, o carinho, a reciprocidade, onde as mulheres possam se amar e relacionar, se expressar, levantar as suas bandeiras e exercer as suas lutas. Essa área é um espaço onde a humanidade jamais será negociada, onde possam viver sem medos. É um espaço revolucionário!
Um dos momentos sublimes da dramaturgia se dá no diálogo que se estabelece entre Nely Coelho e Verônica Bonfim. A primeira vai para as ruas protestar contra o assassinato das mulheres lésbicas, enquanto a segunda permanece na sua residência. Nely deixa transparecer a militância, a defesa dos corpos femininos, a pauta dos direitos. A vida é um direito fundamental!
Ao longo da peça, nos diálogos que se estabelecem, outras conquistas vão sendo mencionadas, como a possibilidade da união estável. O amor entre mulheres é revolucionário!
Revolução significa transformação profunda, ruptura. O amor entre mulheres é um corte radical na sociedade marcada pelo patriarcado.
O elenco é constituído por sete atrizes potentes, determinadas, e engajadas: Carolina Godinho, Dani Nega, Iasmin Patacho, Jessica Lamana, Monique Vaillé, Nely Coelho, e Verônica Bonfim. Elas estão felizes por falarem delas mesmas. Elas se esfregam, se beijam, se abraçam, cantam, dançam, tocam saxofone, bebem cerveja, andam de skate. São vibrantes, pulsantes, deixam o coração falar o tempo todo. Interpretam de forma correta, e deixam transparecer uma forte carga emocional
Dominam o texto e o palco com segurança e firmeza. Apresentam uma linguagem direta e simples, e estabelecem com o público um intenso diálogo. São dinâmicas, e apresentam uma intensa movimentação. Portanto, em suas interpretações associam técnica correta e emoção à flor da pele.
A correta cenografia criada por Carla Ferraz é constituída por um tapete bege contendo manchas douradas com nomes de mulheres lésbicas que lutaram e resistiram pela sua aceitação e reconhecimento.
Na parede ao lado, há uma composição gráfica em formato de leque, onde há projeções e aparecem distintos anos, num período de 1954 a 2014. Esse recorte cronológico deixa transparecer um contexto de um longo processo de conquista de direitos, que ainda está longe de ser finalizado.
Os figurinos criados por Marah Silva são roupas do quotidiano, confeccionadas com bom gosto, e adequadas ao espetáculo.
A iluminação criada por Lara Cunha é bonita, adequada, e realça a atuação das atrizes em suas diversas interpretações.
A trilha sonora da peça nos brinda com canções melodiosas e agradáveis interpretadas por cantoras lésbicas consagradas. Como as atrizes dizem “trilha sapatão”, como Marina Lima, Maria Bethânia, Zélia Duncan, Angela Ro Ro, Mart’nália, entre outros. A exceção foi Ivete Sangalo.
Zona Lésbica é uma excelente peça teatral cuja dramaturgia clama pelo respeito à diversidade de gênero e sexual; clama pelo reconhecimento, aceitação e celebração do orgulho lésbico; tem um elenco de primeiro nível, mesclando emoção e interpretação; e uma trilha sonora que celebra as cantoras lésbicas com suas canções inesquecíveis.
Excelente produção teatral!