
Estreou, para uma nova temporada, a peça teatral Senhor Diretor no teatro Poeira.
A peça é a primeira adaptação teatral do conto homônimo de Lygia Fagundes Telles (1918-2022), extraído do livro “Seminário dos Ratos”, de 1977.
A idealização, adaptação e direção é de Silvia Monte.
O monólogo é protagonizado pela atriz Analu Prestes.
Maria Emília, uma professora paulistana dos meados do século XX, comemora seu aniversário de 62 anos caminhando sozinha pelas ruas da cidade. No passeio, escandaliza-se com as manchetes e capas de revistas numa banca de jornais. Indignada, sente que precisa tomar uma atitude. Decide então escrever uma carta ao diretor do Jornal da Tarde, relatando seu horror pelo caos da sociedade. Enquanto escreve, tem seu pensamento disperso entre recordações e impressões sobre os acontecimentos à sua volta, que vêm desde de sua remota infância aos dias mais próximos.
Analu Prestes interpreta Maria Emília de forma notável, com um talento sem igual, de maneira bem-humorada, discreta, simpática, e comentando sobre todos os assuntos de forma leve e descontraída. Ela fala sobre a cidade, a vida, a velhice, o movimento feminista, a seca, as inundações, Coca-Cola, pornografia, cinema, amor, afeto, entre tantos outros. E procede com um seguro domínio do texto e do palco, envolvendo o público e deixando a todos em êxtase. Apresenta uma intensa movimentação, dominando todos os espaços da ribalta. E uma perfeita comunicação com o público.
A direção é de Silvia Monte, que focou no texto, e deixou a atriz a vontade no palco para realizar a sua livre e notável interpretação.
Silvia Monte também foi a responsável pela correta adaptação do texto literário para o espaço teatral.
O figurino criado por Analu Prestes é de bom gosto, adequado, e discreto, próprio para uma professora aposentada. Ela veste uma camisa de manga comprida em tom rosa clara, e coloca uma flor branca num dos lados, saia comprida preta, meia calça, e sapatos. Uma senhora classuda!
A cenografia de Analu Prestes é mínima: uma cadeira, localizada no centro do palco, e onde Analu realiza uma excelente interpretação.
A iluminação criada por José Henrique Moreira apresenta bonitos desenhos de luz, adequados as cenas, e realçando a interpretação da atriz.
A direção e produção musical de Yahn Wagner, a partir de trilha de Silvia Monte é correta, adequada a dramaturgia, marca as fantasias sexuais da personagem, e ganha destaque o poema “Beba Coca-Cola”, de Décio Pignatari, relacionado ao gosto da professora por Coca-Cola.
Senhor Diretor é uma excelente adaptação de um texto literário para o universo teatral; é interpretado por uma atriz notável, que emociona e contagia ao público presente; e uma direção consistente e precisa.
Excelente produção cênica!