
No metrô, encosto o cartão de gratuidade na catraca e o moço de meia idade comenta com a passageira ao lado:
– Isso é que é bom. Tô doido pra chegar logo aos 65 anos e poder andar de graça nos transportes.
– Vai vendo só como caminha (ou se arrasta) a humanidade.
– Num país onde o caraminguá da aposentadoria (com as desonrosas exceções de praxe) não permitem acesso aos aposentos (muito menos às salas) nem aos remédios, descanso ou atendimento, que rugas ou cabelos brancos são sinais de inutilidade e o passaporte para a vida plena continua com carimbo inacessível, envelhecer é tarefa para os fortes ou muito corajosos.
– O moço no metrô vê vantagem em andar de graça nos transportes porque a aproximação da velhice assusta tanto quanto a morte, e é sempre importante levar alguma vantagem na vida. Só que o moço do metrô não sabe da missa a metade.
– No Rio de Janeiro tem uma linha de ônibus urbanos que liga o bairro do Cosme Velho à Estação Central do Brasil, também conhecida como Estrada de Ferro. Na placa pequena que indica o destino, foram obrigados a reduzir as palavras. Então, ficou descrito assim o itinerário: C. Velho – E. Ferro.
– No ponto, em Laranjeiras, enquanto lia aquela piada pronta, resmunguei:
– É isso mesmo, minha gente. Ser velho é ferro.
Dois ou três ali acharam graça, o que comprovou minha tese de que o humor e a esperança são os últimos que morrem – embora saiba que, infelizmente, os bem humorados e os esperançosos sempre morrem antes.
– Envelhecer é gastar o restinho de força que o corpo armazenou esgrimando, dia após dia, contra preconceitos, hipocrisia, descaso e covardia. Mas como dizíamos noutros tempos, a luta continua e vamos aprendendo, também, que se reclamar piora. E ainda corre-se o risco de o desabafo ser encarado como resmungos ou chororô de velho.
É ferro.
Dia desses, desenferrujando as pernas pelas ruas do Centro da cidade, neste mesmo Rio de Janeiro, sou abordado pelo garoto que distribui aqueles papelins de propaganda de casas de massagem, cheios de fotos de mulher pelada:
– Aí, tio! Cabeça branca paga meia.
– Sorri para ele, pois humor é vida, e guardei o papelinho no bolso, já que de esperanças e ilusões também se vive. Ele sorriu também, vendo que entendi o espírito da coisa, e foi em frente no árduo ofício.
E a vida seguiu o seu curso: bonito, feio, misterioso, atribulado e esperançoso, pois o destino é seguir. Ser velho é ferro, mas nem chegar a ficar velho deve ser pior.