
“CHICO, CANTO E CORPO” traz à cena algumas das eternas canções de Chico Buarque de Holanda, em uma respiração própria: o corpo e a dança. Baseado numa pesquisa musical do trabalho deste notório compositor, natural da cidade do Rio de Janeiro, a bailarina e coreógrafa Andrea Raw cria uma textualidade coreográfica permeada pelo piano de Clarice Prieto, pela voz da jovem cantora Julie Wein e pela narração do ator Igo Ribeiro. As cenas são costuradas por um diálogo entre canto e corpo, voz, dança e presença, em meio a paisagens visuais. As coreografias exploram alguns temas marcantes do vasto repertório de Chico Buarque, como “Eu te amo”, “Beatriz”, “O que será?” e “Cálice”, que atravessam relações, sentimentos, questionamentos sociais e políticos, pontuadas por trechos da literatura do artista, autor de romances como “Budapeste”, “Estorvo” e “Essa Gente”. Em abril de 2023, o artista recebeu a honraria máxima da Língua Portuguesa, O Prêmio Camões, numa cerimônia em Portugal, das mãos dos atuais presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva e de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa. Portanto, esse é um momento mais do que fortuito para homenagear a obra singular desse grande compositor e autor do Rio de Janeiro e do Brasil.
A grandiosidade da obra de Chico Buarque é daquelas que não se pode nem descrever. Por isso, este trabalho adota uma outra abordagem, mais próxima: explorar em cada canto, corpo, voz e nota musical, a potência de sua obra. Buscar por entre a magnitude e extensão da trajetória de uma vida inteira, pequenas fagulhas de genialidade e deixá-las dançar pelo corpo. Entre diferentes suportes – o corpo, a voz, a sonoridade e a paisagem visual – “CHICO, CANTO E CORPO” estabelece seu arco dramático e afetivo, pesquisando os caracteres chave da estética moderna. Diferentemente do ballet clássico, conhecido, e da dança contemporânea, muitas vezes um pouco hermética e experimental, a dança moderna se estabelece como um “caminho do meio”, e, enquanto tal, tem um caráter bastante formativo e auxiliar, no sentido de se criar novas plateias, tornando a sua perspectiva de enriquecimento cultural bastante clara. Assim como a obra de Chico Buarque, a dança moderna surgiu como disruptiva: na história da dança mundial, foi responsável por importantes quebras de paradigma em relação à dança clássica, abrindo os caminhos ao que hoje se compreende como dança contemporânea. Por outro lado, com a força avassaladora e a velocidade do movimento contemporâneo, a estética moderna, por muito tempo, foi relegada a segundo plano. Inclusive, em âmbito Sul-Americano, Andrea Raw, formada pela prestigiosa Martha Graham School de Nova York/EUA, é uma das grandes responsáveis pela re-difusão da dança moderna, com seu incansável trabalho de formação, há 14 anos na promoção de intercâmbios nacionais e internacionais de qualificação profissional em técnicas de dança moderna.
Este espetáculo discute a tradição de ruptura ou o potencial de ruptura no interior das tradições, à medida em que se utiliza de conteúdos canônicos (a produção de Chico Buarque e as técnicas de dança moderna) com poderes de ruptura, cada um à sua forma. O campo visual do espetáculo, composto por elementos de figurino e cenografia, dialoga com a dramaturgia das letras do autor, alternando matizes e paletas inspiradas pelos sentimentos e atmosferas evocadas em cada quadro. Realizado pela Companhia Dança 3/Andrea Raw, fundada em 2012, “CHICO, CANTO E CORPO” estava em fase de finalização e com estreia marcada para março de 2020, quando a quarentena por causa da COVID-19 foi decretada. A estreia não aconteceu e os trabalhos foram suspensos. “CHICO, CANTO E CORPO” foi contemplado pelo Prêmio FUNARJ de Dança 2022 para ser produzido e realizar sua estreia, o que ocorreu em dezembro de 2022, no Rio de Janeiro.
Sobre a Companhia Dança 3/Andrea Raw:
Criada em 2012 no Rio de Janeiro pela bailarina, professora, coreógrafa e produtora Andrea Raw, a Cia Dança 3 usa as técnicas de dança moderna para a preparação física de seus bailarinos, além do Balé Clássico, Pilates e musculação. Andrea Raw tem formação na Martha Graham School de NY e, com 40 anos de prática em dança em múltiplas linguagens, acredita em uma formação diversificada e abrangente a respeito da estrutura corporal à luz da consciência corporal e de práticas da educação somática, como um caminho necessário para a consolidação de bailarinos resistentes e expressivo.