
O álbum surgiu dentro do contexto da pandemia, e por um conjunto de situações. Me vi muito emocionalmente despedaçada, com vários lutos para superar, e sem a menor perspectiva ainda de trabalho, visto que eu, antes da pandemia estava completamente empenhada dentro do teatro musical, e com um contexto de experiência de trabalho muito mais de palco, do que de estúdio. Naturalmente o violão e o piano foram me tornando mais próximos do que nunca, e foram surgindo essas canções, como forma de me estruturar internamente. Acho que foi uma forma mesmo de sobreviver a tantas aflições. Eu já compunha antes, mas fiquei absolutamente mais focada em finalizar, dar acabamento, dar atenção a essas dores – minhas e de todos – e a impressões internas que precisavam ser colocadas para fora, de forma poética.
JP – Quais são as canções que você gostaria de destacar no álbum acima referido?
Gosto de todas, mas Rematilha e Ópticas talvez sejam as minhas favoritas.
JP – Quando surgiu o seu interesse pela música?
A música faz parte da minha vida de maneira tão presente, que não saberia explicar, não tem um começo exato. Eu tinha um bloqueio muito grande de cantar na frente da minha mãe por toda minha infância e adolescência. Não sei explicar o motivo, mas eu sempre tive pânico. Talvez, por esse ser um medo muito grande, eu sempre entendi que significava muito pra mim cantar. Sempre fui muito atenta às vozes nas canções, e música era como uma melhor amiga. Fui fazer cinema, teatro, mas meu interesse pela música era tão natural que eu não conseguia ver como um ofício ainda. Mas era minha base. Tive banda na adolescência, todos meus amigos eram músicos, e nunca passei muito tempo sem exercitar meus instrumentos, etc. Até que caiu a ficha que meu caminho fazia mais sentido nessa órbita.
JP – Como se deu a sua formação como cantora?
Voltei a cantar durante minha pesquisa pra conclusão do bacharelado em Artes Cênicas. Antes disso, eu achava minha voz muito suave, muito doce e não gostava de como eu cantava. Eu não sabia como treinar minha voz de maneira a atingir outras camadas de interpretação e me julgava demais. Com o teatro, eu pude entender melhor a minha versatilidade, e o quanto a voz tinha potência, independente do quanto eu julgava. E com o tempo, e com bons mestres e mestras, pude aplicar e descobrir essas outras facetas, como usa-la como um instrumento, ou como lembrar de algo cantando, que saísse do cotidiano. Pude me surpreender tanto, que continuo nesse caminho, de pesquisa, da voz-movimento, com minha professora que eu amo, Chiara Santoro. Mas tive excelentes pessoas, profissionais ou não no meu caminho que me abriram pra essa escuta.
JP – Atuando no teatro, você já cantava! Como foi a experiencia de interpretar Judy Garland?
Foi uma experiência bem forte. Mas sim, foi um desdobramento de alguns anos que passei em sala de ensaio, mais do que em cena de fato. Meu trabalho passou muito pelo treinamento do ator/performer. Continuei com uma pesquisa que tratava do canto em cena, antes de me desafiar no teatro musical, e tudo isso me ajudou pro meu trabalho hoje em dia, e com a Judy Garland, não foi diferente, foi muito especial. Isso aconteceu pois o texto falava sobre essa luta do performer que nasce pro ofício, e que passa por situações muito desafiadoras – psicologicamente falando- para estar no palco, para o público só assistir uma pontinha no iceberg, que é a magia do espetáculo. O mundo artístico passa, e naquela época, mais ainda, por momentos de provação muito intensos, ouvimos que não era importante para o Brasil – termos artistas – o contexto era tão surreal, que tudo isso aparecia de alguma forma na personagem.
JP – Quais são os gêneros musicais que você prefere cantar?
Depende, claro que tem gêneros que fizeram minha trajetória, e fazem mais sentido com meu tipo vocal, mas gosto de soul, mpb, pop, blues, jazz, samba, bossa, rock, folk, forró algumas coisas, baião, aboio. Gosto de muitos gêneros.
JP – Como você analisa a escalação de influencers em programas de música na televisão?
Não posso condenar, mas não acho uma prática louvável, pois existem artistas incríveis que são solenemente ignorados por conta dessa prática. Eu comecei minha carreira artística sem possuir redes sociais, porque eu não achava que ajudava minha concentração naquele momento, e era julgada. Pensavam que era arrogância, ou algo do tipo, enfim. Mas eu não gostava de assistir pessoas sensíveis que não eram escaladas pra trabalho em virtude de outras que tinham as redes mais movimentadas. Tive muita dificuldade em me encontrar nesse mundo digital, porque eu via o que era não fazer parte dele. Mas com o tempo, fui entendendo a lógica, e já passei por esses períodos de vício nas redes, comparações, e essas problemáticas. Acho um pouco triste, mas são escolhas que não tenho controle. Não vejo uma diminuição desse tipo de prática que não passe por uma regulamentação na lei.
JP – Quais são os seus projetos futuros?
Tenho um EP de inéditas em fase de gravação, planejo um álbum também para o ano que vem. Mais shows, mais participações e convites de outros artistas e viajar com o tributo ao disco “Previsão do Tempo” do Marcos Valle que estamos ensaiando.