
Pai&Filho - Atores Cláudio Marconcine e Jorge Choairy Foto de Ayrton Valle
O espetáculo é uma produção da Pequena Companhia de Teatro do maranhão. O texto é livremente inspirado na obra Carta ao Pai, de Franz Kafka, outra encenação de um texto literário, deixando transparecer a relação entre teatro e literatura.
O texto de Marcelo Flecha é denso, potente, reflexivo, crítico e instigante, apresenta a relação entre pai e filho, em que impera uma relação de hierarquia e subordinação, em que o primeiro busca dominar o segundo, humilhando-o quando o chama de “inseto daninho” ou Parasita”. São distantes, e antagônicos. O pai afirma que ama o filho, e diz que ele é a sua esperança, lhe dá tudo do bom e do melhor, mas é duro com ele, não aceita desobediência, nem desrespeito, lhe faz insultos e ameaças, traumatizando-o.
Por sua vez, o filho é dominado, submisso, expressa temor em relação à figura paterna. Contudo, ainda que tenha medo, responde o tempo inteiro, estabelecendo com seu pai diálogo tenso, conflituoso, expressando ira e decepção, por meio de uma linguagem dura, seca, áspera, em que um ataca o outro, e revida, um toma lá da ca. Em alguns momentos deixam os ataques verbais e partem para um contato, um segurando o outro, ainda que nao se agridam.
É uma relação amarga, um pai duro, omnipresente, que nao aceita questionamentos. Contudo, sustentou o filho e cumpriu com a sua missão de educa-lo e forma-lo. O filho tem letras, conhecimento. Ele produz livros. Portanto, ele possui as “luzes do conhecimento”, e nao aceita a tirania, nem a opressão. Nso aceita leis e ordens. Acredita que os livros servem para a instrução, e são um antídoto contra a ignorância. Ele quer fazer uso público da sua razão, proclamando-a livre e soberana, sem a interferência de alguém. E a sua libertação se dá por esta via.
Em nosso ponto de vista, a cena que sintetiza a peça é a da refeição, quando o pai deixa transparecer todo o seu autoritarismo obrigando o filho a comer.
O elenco é integrado por dois atores: Jorge Choairy (no papel do Filho) e Cláudio Marconcine (como o Pai). Eles atuam com perfeição, apresentando interpretações convincentes, e emocionam. Apresentam uma forma de andar, de falar e um gestual adequado ao texto, e bem ensaiado. Eles exprimem sentimentos em seus diálogos. Dominam o texto e o palco. Estão sintonizados e entrosados. Portanto, uma atuação de qualidade.
A direção é de Marcelo Flecha que realizou as marcações precisas e pontuais, e direcionou a atuação de qualidade dos atores.
Os figurinos criados por Marcelo Flecha são de bom gosto, primam pela originalidade, e adequados.
A cenografia criada por Marcelo Flecha é original, criativa, produzida a partir de materiais reciclados, e adequada. Ela é constituída por cubos que são utilizados para diversos fins; livros de papelão; um escrevedor; um alfaiateiro, e um linheiro.
A porta da residência tem inicialmente este uso, mas também pode ser tampo da mesa ou cama.
Os cubos podem servir de assento, bem como base da mesa, e de escada.
No fundo, onde inicialmente estava a porta, há uma estrutura feita a partir de madeira reciclada.
A iluminação criada por Marcelo Flecha apresenta um bonito desenho de luz, predomina a luz branca, em alguns momentos intensa, em outros menos, e contribui para realçar a interpretação dos atores de seus personagens.
Pai e Filho apresenta um texto denso e profundo, que discute e reflete sobre as relações familiares; dois atores ajustados e afinados, com uma atuação de qualidade; e, uma cenografia criativa e marcada pela originalidade.
Excelente produção cênica!