
(…continuação)
Uma cidade especial com pessoas especiais. Quando lá cheguei, nos primórdios da Rio-Santos, ainda não havia para mim Sônia Braga, a sua mais completa revolução. As ruas tinham nomes de figuras ilustres como Maria Jácome de Mello, mascates pelos caminhos e lojas com estrutura arquitetônica de dois séculos atrás. Muita gente bacana. Cheguei, quando o Zé Murilo, fazia colchas de retalho, de um colorido sutil, como se fora o céu azul-anil das noites Paratienses. Conheci o Seu Costa, da Casa Costa, pai da Maria Inês, que vem a ser avó da Nanda Costa. Batíamos altos papos. Às vezes, passávamos as tardes conversando. Quando a mãe da Nanda retornava da escola, fazíamos a lição de casa ali naqueles balcões em pinho-de-riga, ornados por marchetaria e emoldurados com vitrines em cristal. Uma alegria!
Na mais linda cidade da Costa-Verde, fiz amizade com o Mauro dos Barquinhos, sujeito simpático e papo agradável que hoje tem a maior loja do Centro Histórico para venda desses artigos artesanais, preparados pelos caiçaras da região. Outro que se tornou grande parceiro foi Chico Preto, sempre sentado no alpendre de seu quintal, me contando contos, aumentados é claro, de piratas que visitavam a região e de vários tesouros que esconderam pelos terreiros e praias daquele torrão. Viajava em suas histórias fantásticas e, por muitas vezes, fiquei tentado a me munir de uma pá e um detector de metais em busca dessas arcas perdidas. Um desvario!
Na Fazenda Murycana, alambique de primeira, onde era preparada a cachaça azul, à base de casca de tangerina, fiz amizade com Mazinho, apresentado pelo Zé Luiz – dizem que o nome levava, no diminutivo, a fama de seu portador. O fato que sempre me tratou muito bem. Foi meu anfitrião, juntamente com suas quatro companheiras, para intermináveis almoços cujo cardápio – leitão à pururuca, preparava como ninguém. Tudo regado por Murycana Azul. Nessa época, a fazenda abrigava um zoológico com emas e jaguatiricas soltas. Havia uma macaco-prego chamada Lili. Quando ia até àquela herdade, Lili cismava de se aboletar em meus braços. Uma graça!
Outra amiga-perene, da cidade de 358 anos de história, é a Marina Gouvea, poeta, escritora, bordadeira delicada e artista plástica incrível, mulher encantadora e gentil. Eu me deliciava com histórias da cidade contadas por ela, sua colonização e desenvolvimento ao longo dos séculos. Como me hospedava na pousada contígua à sua casa, ficava à noite conversando no alpendrado, por horas, com ela. Uma diversão!
E assim se passaram 46 anos. As estradas foram asfaltadas – finalmente Paraty-Cunha (aleluia!!), o progresso chegou, vieram os filhos, os netos, os bisnetos, outros partiram para o etéreo, se aposentaram, mudaram de cidade. A vida fluiu.
Viajar é preciso, nem que seja no tempo, no coração ou no lembrar!