
Hoje comemoramos o dia internacional do livro, ocasião muito oportuna para se falar da importância da leitura. Ainda somos um país que lê pouco, mas não há como contestar que houve avanços. Ainda se faz necessário democratizar mais o acesso e criar mais mecanismos de incentivo.
A leitura traz inúmeros benefícios no desenvolvimento humano e para crianças essa possibilidade pode ser um divisor de águas para a vida. Outro importante benefício é o impacto da leitura na formação de vínculos afetivos, especialmente quando compartilhada entre familiares. O hábito de ler em família fortalece os laços, promove momentos de interação e cria uma relação mais próxima com o conhecimento. A leitura é um hábito dos mais salutares, portanto, como todo hábito precisa ser incentivado e estimulado.
Nesta coluna, destaco quatro livros sobre dramaturgia, outra arte, talvez a maior delas, que aliada à leitura produz incontáveis benefícios, sobretudo, porque é no teatro que o homem pode se enxergar com lupa. Todos os títulos são lançados pela editora Gobogó.
Não me entrego, não
Trata-se de um texto que cobre nove décadas da vida e trajetória de um dos atores mais expressivos e consagrados do cenário artístico brasileiro: Othon Bastos. A vida de Othon é recheada de momentos inusitados e muita perseverança. Ainda jovem, na adolescência ouviu que seguir carreira artística não deveria ser uma escolha. Fizesse tudo, menos isso. E não é que a vida, sabia, dá suas voltas e contradiz certezas. Assim Bastos por um acaso encontrou o teatro. Nunca mais se afastou dele, e deu nisso: um ator brilhante com uma carreia exponencial.
Flávio Marinho habilidoso escritor e dramaturgo, profissional que consegue como poucos traduzir a dramaturgia de forma palatável e inteligente transcreve essa trajetória de forma deliciosa, lúdica, bem humorada e extrai do ator o melhor nessa revisita de décadas a frente do ofício, que felizmente o arrebatou. O livro é tão interessante como peça, o que merece consideração. Se você não assistiu à peça, torça para que volte em cartaz, mas até lá se delicie com a leitura tão envolvente e atraente como a encenação.
Sete Minutos
Antonio Fagundes, ator de primeira grandeza, retrata em Sete Minutos as diferentes formas de interrupção que ocorrem durante um espetáculo, que além de atrapalhar radicalmente os atores, é uma falta de educação gravíssima. No entanto, e infelizmente, é uma prática muito comum. Será que o público ainda não conseguiu entender o que envolve uma dramaturgia e realidade cênica? Essa é uma questão ainda sem resposta. Sete Minutos propõe uma reflexão sobre o tema a partir de um ator que é interrompido durante a apresentação do famoso clássico Macabeth, de Skakespeare, por conta de um celular que toca na plateia, nada menos que oito vezes e o expectador atende com naturalidade. Várias outras situações ocorrem; comer balas desembrulhando-as nas primeiras filas, tosses altas, risos exagerados, distrações diversas que perturbam totalmente a atenção dos atores, como também refletem desrespeito ao trabalho dos atores que se preparam bastante para entrarem cena. Desejam fazer o melhor espetáculo a cada dia e a plateia precisa ser cúmplice, no mínimo respeitosa. O teatro é uma via de mão dupla, é necessário que o público compreenda essa relação. Sete Minutos é a síntese dessa necessidade tão premente do ator para a realização de um espetáculo de verdade. Uma leitura essencial.
Dois de Nós
As relações humanas sempre são um prato cheio para o teatro. É o tema certo no lugar certo. Dois de nós, de Gustavo Pinheiro, traz o recorte das relações para o palco. O humor sempre presente na história de dois casais de classe média que enfrentam conflitos frente a mudanças sociais e comportamentais que o mundo contemporâneo apresenta.
Assuntos como empoderamento, etarismo, preconceitos, abuso de poder, estão em cena, vividos por esses casais de diferentes idades.
Assuntos urgentes para uma sociedade que está em transformação e leva o público a diferentes emoções e reflexões. Gustavo tem uma escrita fluida que se traduz em cenas bem acabadas, e certamente em uma dramaturgia de interesse do público, assim como a leitura do livro.
Um Jardim para Tchekhov
Revistar clássicos é um ótimo ponto de partida para textos teatrais. Um Jardim para Tchekhov é um destes textos que a partir da dramaturgia original apresenta uma peça sobre o desejo de uma atriz desempregada, enfrentando a falta de dinheiro e de convites voltar aos palcos. Esse é o mote escrito por Pedro Brício. No seu processo de reinvenção, a atriz, pretende voltar à cena com um clássico da dramaturgia mundial; O Jardim das Cerejeiras de Tchekhov.
Morando de favor na casa da filha, a atriz encontra no playground do prédio, um homem que afirma ser Anton Tchekhov. Nada mais preciso e interessante. A partir de então, começam a ensaiar a peça e conversar. As conversas tomam vários rumos com toques contemporâneos, especialmente sobre os desafios da atualidade, esbarrando em ficção, passado, futuro e presente. Um texto reflexivo que pega o leitor pela ideia inusitada, muito próximo da realidade. Tudo isso a partir de um clássico.