
Quando recebi a proposta gerou em mim um grande entusiasmo, não só pelo trabalho e pelo papel de “Julieta”, mas também por ter tido a oportunidade de trabalhar com grandes artistas, como Ana e Marcelo.Federico Fernandez: Tive o privilégio de ser convidado por Marcelo Misailidis e Ana Botafogo para este projeto, que aceitei com muito entusiasmo. Conheço os dois há muitos anos e a qualidade humana e artística é o que não me permitiu hesitar em aceitar.JP – Como está sendo a preparação da dupla para a apresentação?
Eliane Figueroa: Esses dias estivemos ensaiando muito intensamente. Aprendemos a coreografia, os passos e a grande importância de contar o enredo dessa história. Recebemos em primeira mão o significado de cada cena e de cada gesto. Foram dias de muita inspiração, e agora nosso trabalho é o de processar todas essas informações valiosas para entrar na pele dos personagens.
Federico Fernandez: Veloz, entusiasta e maratônica, ambos vieram a Buenos Aires para nos dar detalhes da obra. Com Eliana, minha “Julieta”, é uma companheira ideal com a que compartilhei diversas obras, cenários e projetos. Assim é todo muito mais harmonioso.
JP – Romeu e Julieta é uma história trágica. Como esse caráter trágico aparece na coreografia?
Eliane Figueroa: A coreografia é planejada de forma que seja possível vislumbrar toda a trama, desde o primeiro encontro dos jovens, quando se tornam namorados, as oposições e os acontecimentos que frustram seus planos. Neste caso a história é contada, do início ao fim, pelos seus dois protagonistas. As cenas e duetos sucedem-se, respeitando a cronologia dos acontecimentos, sempre apoiadas no significado dos gestos, no sentimento que os passos transmitem e claro na musicalidade de Tchaikovsky. Tudo isso, aliado a algumas mudanças no ambiente e nas luzes, permite que a tragédia evolua e se desenrole com profunda emoção.
Federico Fernandez: Aparece de forma concreta e resumida de forma perfeita. Em um único quadro vamos desde o primeiro encontro, o baile, a cena da varanda, o casamento….e o final.
Como disse antes, uma maratona de dança e emoções.
JP – A solução do jovem casal foi a morte. Como será representada na apresentação?
Eliane Figueroa: Na cena final, como na tragédia de Shakespeare, Julieta acorda após tomar a poção que a fez parecer morta e a princípio pensa que tudo correu como esperado. Ao ver Romeu caído no chão, ela corre ao seu encontro, mas ao descobrir que ele está sem vida, tudo desaba para ela. Após tentar assimilar o ocorrido, ela pega a adaga que está perto do corpo do amante e decide suicidar-se. Este é um momento culminante do drama, e tive o prazer de ver Ana narrar e fornecer as ferramentas e chaves para realizar uma cena de tamanha importância.
Federico Fernandez: A única coisa que vou falar sobre isso é que quem está montando esse final para nós é o Misailidis e a Botafogo. Com isso já estou contando o que vai acontecer. A construção cênica é o mais importante e de mãos dadas com eles…
JP – Como está sendo essa experiência de serem dirigidos por dois bailarinos reconhecidos internacionalmente, Ana Botafogo e Marcelo Misailidis? É um momento de aprendizado?
Eliane Figueroa: Quando soube que esta experiência seria guiada por eles, senti uma grande motivação e grandes expectativas. Os dois vieram a Buenos Aires para nos ensinar tudo sobre essa dupla. Os ensaios foram um processo de aprendizagem enriquecedor e intenso, que se tornou muito fluido graças ao carinho e generosidade de Marcelo e Ana. Também nos permitiu desfrutar das marcações, ao vivo e diretas, de uma dupla artística tão maravilhosa. O desafio é grande, mas extremamente inspirador.
Federico Fernandez: Com Ana dancei “Margarita e Armando” em uma turnê pelo Brasil, em sua comemoração de 35 (trinta e cinco) anos como primeira bailarina.
Aprendi tudo, principalmente como lidar com a cena, como olhar para o outro e como fazer o público participar das diversas emoções. Marcelo naquela época agia como meu pai, seu passeio cênico, seu peso e seu profissionalismo fizeram com que todos nós pudéssemos observar o que só um passeio ou uma série dramática poderia gerar. Ambos são professores naturais.
JP – Vocês são bailarinos do Teatro Colón de Buenos Aires. Como está o funcionamento do teatro? Quais são as produções artísticas no campo do ballet que estão programadas para a temporada 2024?
Eliane Figueroa: Este ano a temporada de Ballet conta com cinco produções. Iniciamos o ano com Carmina Burana, de Mauricio Wainrot, com orquestra, coral, coral infantil e cantores solo, todos os corpos reunidos na sala principal do Teatro. Em junho faremos A Bela Adormecida, de Mario Galizzi, seguida de uma programação mista em setembro. Dançaremos Giselle em outubro, e fecharemos o ano com Bayadera em dezembro.
Federico Fernandez: O Teatro Colón é um dos teatros mais importantes do mundo e possui uma das mais antigas companhias estáveis. Sempre temos temporadas com produções internacionais.
Às vezes somos melhores e outras vezes… bem, dependemos de políticas públicas culturais que às vezes tendem a ser mais excludentes e estas geram grandes desigualdades e também o crescimento de momentos mais medíocres. Somos um reflexo da sociedade, não somos uma bolha à parte de tudo.
JP – Num panorama geral, como se encontram as produções no campo da dança no cenário argentino contemporâneo?
Eliane Figueroa: Este é um momento muito particular, o país está a sofrer uma profunda crise econômica. São tempos difíceis e isso se reflete em diversas áreas da Argentina.
Federico Fernandez: Temos companhias contemporâneas muito boas como o Ballet San Martin ou a Companhia Nacional Contemporânea, têm produções o tempo todo e de coreógrafos nacionais e estrangeiros. Há um grande público para a dança em geral.
JP – Quais são os seus projetos futuros? E, para finalizar, deixe uma mensagem para os seus seguidores.
Eliane Figueroa: Sou muito grata por tudo que essa arte me permite vivenciar, e minha vontade é continuar curtindo a dança. No futuro gostaria de ver mais projetos como este se concretizarem. Poder viajar, atuar e estar em contato com artistas de outros lugares do mundo são experiências que nos enriquecem e nos fazem crescer; como artistas e seres humanos. Hoje, ser mãe, poder conciliar também a minha vida familiar com uma oportunidade como esta, é algo que me faz sentir sortuda.
Federico Fernandez: No próximo mês, eu estarei dançando a Bela Adormecida em uma nova encenação no Teatro Colón, depois farei também uma turnê pelo Brasil e com minha companhia Buenos Aires Ballet estarei no México, e em vários países da América Central.