
Estreou Cobras, Lagartos e Minhocas no teatro do CCBB-RIO 3.
O texto é de autoria de Álvaro Menezes, que se caracteriza por ser biográfico e de memória ficcional, na medida em que nos apresenta uma construção coletiva de histórias narradas a partir de um personagem. São diversas histórias da vida de um personagem, que vão da sua infância, juventude, e fase adulta, que estão todas associadas. O personagem principal narra a sua própria vida. Ou seja, ele próprio constrói a sua biografia.
O personagem é um homem de meia idade, casado e com filhos. Ele narra a sua vida de cabo a rabo.
O homem inicia no fim da infância, quando pegou um pedaço de pano e fez um vestido, trancando-se no seu quarto e ouvindo Gal Costa; as namoradas; Ela, a mãe dos filhos, a mulher da vida; 25 anos casados; o sonho de ser arquiteto; o pai; se matrícula na engenharia; a internação do pai; a relação com o pai: sem intimidade; a paixão do pai pelo futebol; o campo de futebol na casa de praia; verão de 1985: o primo o chama para fazer inscrição na faculdade de teatro; no teatro conheceu o amigo Caco; Caco o convidou para fazer uma peça de teatro; conheceu na peça o Alberto; o ensaio na casa de Alberto e rolou um clima; 1988: o medo da AIDS; fim de semana na casa de praia dos amigos; uma transa com um rapaz na casa; a turma de garotos do edifício; energia sexual; a camisola da mãe escondida no cesto; levou uma surra do pai; mudou de residência; quarto e colégio; o colégio dividia os alunos em três categorias de jogadores de futebol: cobras, lagartos, e minhocas; o aluno nota dez, mas solitário e sofria bullying; o álbum de figurinhas e a agressão contra o colega, que foi sarrado e levou um chute no saco; ficou atónito assistindo tudo, enquanto os outros riam; o professor Braga; o último chopp e o momento de divórcio; ela deu um abraço; foi viver sozinho, cheio de dúvidas e dívidas; pensar e refletir; um homem sozinho.
Portanto, o homem narra todo um manancial de histórias que integram a sua memória individual, entrelaçando passado e presente. Segue uma sequencia linear e cronológica.
Convém sublinhar que são as memórias do personagem interpretadas pelo ator. E, não as memórias deste último. Ainda que ficcionais, elas exprimem alegrias e felicidades, tristezas e amarguras, tensões e conflitos. Como diz uma passagem do texto, a vida é uma caixa de bombons. Tem dias de Serenata do Amor. Outros são de chocolate de figo.
O ator protagonista é Álvaro Menezes. Ele atua de forma exitosa, com garra, vibração, bem humorado, e transbordando emoção. Ele se movimenta por todo o palco, de um lado para o outro, num pique só. Domina o texto, passando-o com segurança e firmeza, por meio de uma linguagem acessível e compreensível, fato que facilita a comunicação com o público. Ele apresenta uma notável técnica interpretativa, e emociona. Ele narra as memórias do seu personagem com emoção, transbordando sentimentos. Portanto, uma atuação altamente qualitativa.
Complementa a atuação do ator uma série de projeções exibidas ao fundo do palco com o nome de mulheres e homens mencionados pelo personagem que tiveram alguma relação com a sua vida.
A direção de Cesar Augusto focou no texto e deixou o ator a vontade para realizar a sua livre interpretação. O ator está livre, leve e solto sob a ribalta.
A trilha sonora é bastante diversificada e composta por grandes nomes da música, como Gal Costa.
O figurino de Marcelo Olinto é adequado e facilita a intensa movimentação do ator pelo palco. Inicialmente, ele veste um casaco azul, uma calça preta, e calça um tênis branco com listas verdes E, num segundo momento, camisa de alça preta, e short verde, e calça tênis com meia branca, como um jogador de futebol.
A cenografia de Beli Araújo é uma representação de um campo de futebol com a trave do gol. O futebol é um elemento importante na memória do personagem, seja familiar, como do tempo de escola.
A iluminação criada por Adriana Ortis apresenta um bonito desenho de luz, em que predomina a luz branca, embora haja outros tons, como o vermelho, e busca realçar a correta atuação do ator.
Cobras, Lagartos e Minhocas é um ótimo monólogo, com um texto biográfico e de memória ficcional de fácil compreensão; um ator com uma ótima atuação, associando interpretação e emoção; e, cenografia, figurinos e iluminação adequados e corretos.
Ótima produção cênica!