22 de março de 2023

Muito tímido desde pequeno, ele  buscou artes cênicas na esperança de aprender a lidar com sua timidez, mas foi na dança  que encontrou  a melhor maneira de se expressar e se superar. Meu convidado dessa semana é o bailarino Renato Marques.

JP – Você diz que a dança o salvou. Como é isso?

Dançar foi uma tábua de salvação, minha  válvula de escape, em um período de muitos conflitos internos e familiares.  Dançar era estar suspenso e alheio a tudo e todos. Momentos de um prazer total,  que nunca me cansava.

JP – Você pensava em sobreviver da dança?

Nunca pensei na dança ou na arte como meio  de ganhar a vida profissionalmente. Era somente uma atividade que isolava dos problemas.

JP – Você chegou a ter outra profissão?

Antes de dançar e, durante anos, tive diversos trabalhos. O primeiro foi aos 9 anos de idade, após a morte de meu pai. Dava aulas de português e matemática para os vizinhos e isso me  rendia um valor simbólico, mensalmente. Um tempo depois passei por outros trabalhos alternativos. Faxineiro, vendedor de empada, de cachorro quente, de bata frita, de roupa, de jornal, eletricista, animador de festa e até artesão, pintando e construindo material para aniversários e escolas de samba.

JP –  Você acha que tudo isso contribuiu de alguma maneira na sua formação?

Todo este histórico de vida só  me fez enriquecer,  dedicava meu tempo aos estudos, às artes cênicas e à dança.   Certo dia, questionado sobre o que faria com o conhecimento adquirido na arte, eu, que nunca havia pensado no assunto, passei a considerar tal possibilidade.

JP –  Então isso foi um botão de start?

Sim, foi aí que decidi  aceitar o convite para ministrar aula de dança e, naquele preciso momento, aquele menino de 9 anos voltou às suas lembranças, e percebi que transmitir o conhecimento era de fato meu ofício, a sensação de pertencimento e a certeza de estar no lugar certo, fazendo o que de fato nasci para fazer. Naquele instante, nasceu a estrela, Renato Marques, um artista comprometido com a profissão. Redobrei a atenção aos estudos, ampliei meu campo de atuação e fui além de todas as perspectivas daquele menino que nunca imaginou sair de uma realidade conturbada e sem referências.

JP –  E como foi ter a dança como profissão?

Encarar a dança como profissão não foi fácil e segue sendo um estímulo. Em um país não educado para arte e nem para os artistas, é um desafio diário manter a dignidade e a qualidade no ofício. Porém, a perseverança sempre foi minha alavanca, minha mola propulsora.

Poucas pessoas têm conhecimento de seu currículo. Em um período trabalhando em um espaço de artes, escreveu “Filhos da Rua”, para um grupo de artes cênicas. Anos depois, montou seu primeiro musical inspirado no Livro de poesias de Herculano Farias. Escreveu, dirigiu e dançou em Federico García Lorca, “O Último Passo”, Volver, Amor Além da Vida e Frida Kahlo “O Cárcere”. Participou de alguns programas de TV, dançando e dando consultoria. Mas o que ele classificou como um momento especial em sua trajetória, foi o convite para participar da Ópera D. Quixote. Especial, pelo fato de ele ter completado, na época, 40 anos e estar dançando em um teatro referência, o Theatro Municipal do Rio de Janeiro. “Foi um presente”, diz. Seu desejo por conhecimento não cessa e isso não se restringe apenas ao universo da dança, e, sim, em tudo que envolve o corpo e as energias que o cercam.

Renato não para nenhum instante. Dedica parte do seu dia estudando anatomia e fisiologia, algumas terapias orientais e também pilates. Faz eventos a replicar a cultura hispânica, tablaos, lugar onde músicos e bailaores (dançarinos de flamenco) se encontram para a prática da música e dança flamenca.  Durante o confinamento imposto pela pandemia, ele começou transmitir suas aulas de forma virtual e assim trouxe à luz o seu método, Diálogos Corporais, trabalho oriundo de anos de pesquisa sobre movimentos. Esse trabalho segue até hoje em suas redes sociais, mostrando sua metodologia e linguagem própria para falar de corpo e com o corpo.
Renato Marques é um homem que fez da arte seu modo e único meio de vida e essa arte não será limitada ou rotulada.
“Arte é o estado de plena consciência do corpo e da alma, mantê-los alinhados é uma luta diária e um firme propósito para seguir saudável para poder transmitir mais que movimento. Meu propósito é servir a vida e dela se nutrir”, finaliza.

Espetáculo Volver, amor além da vida , Teatro Municipal D. Pedro – Petrópolis 2014
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